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Dia 4 da UNOC3: governança oceânica em debate e dia histórico para a pesca artesanal

  • comunicacao5558
  • 12 de jun.
  • 5 min de leitura

Atualizado: 20 de jun.

Evento coorganizado pelo Linha D'Água na UNOC3 reforça protagonismo das comunidades pesqueiras e a urgência de pactos globais por direitos e equidade.



Com falas emocionantes e reivindicações firmes, o 4º dia da UNOC3 pavimenta caminhos para transformar o reconhecimento da pesca artesanal em políticas efetivas

O 4º Dia da UNOC3 entrou para a história ao colocar no centro da agenda internacional a pesca artesanal e a voz dos povos do mar. Um dos momentos mais potentes da conferência foi o evento paralelo "Pesca artesanal de pequena escala: no centro da governança oceânica e segurança alimentar", coorganizado pelo Instituto Linha D'Água, em parceria com organizações internacionais. O evento reuniu pescadores e pescadoras de todas as partes do mundo em uma sala tomada por aplausos, relatos comoventes e reivindicações firmes por direitos, dignidade e reconhecimento.


"Essa é minha vida, meu sangue - é pelo mar que eu existo", disse Raissa Nadège Leka Madou, da Costa do Marfim, em um dos discursos mais marcantes. Além deste evento paralelo, o dia foi marcado por discussões decisivas sobre justiça social, governança colaborativa e valorização dos saberes tradicionais.


Ao final do encontro, com a sala lotada e aplausos constantes, ficou claro que esse não foi apenas mais um evento em meio a dezenas de sessões da conferência - foi um chamado coletivo pela centralização da pesca artesanal de pequena escala na agenda de oceano, pela equidade e transformação das estruturas de poder, que historicamente marginalizam os verdadeiros guardiões do mar. Para além da simbologia, o evento pavimentou caminhos para pactos concretos entre comunidades e governos, baseados em direitos humanos, soberania alimentar e governança participativa. Confira os destaques:


Painel sobre pesca artesanal mobiliza vozes globais e reivindicações históricas

O painel co-realizado em Nice pelo Linha D’Água também teve a representatividade feminina como um dos pontos mais marcantes. “Nós, mulheres, estamos em todos os elos da cadeia da pesca: somos economistas, ambientalistas, educadoras - mas seguimos invisíveis”, reforçou Raissa Nadège Leka Madou. Já Zoila Bustamante Cárdenas, presidenta da Confederação Nacional de Pescadores Artesanais do Chile, foi direta: “Não sou esposa de pescador. Sou pescadora. Vivo no oceano. Sou o oceano.” Ela criticou a ausência de pescadores artesanais nos espaços de decisão e exigiu participação real nas políticas internacionais: “Quem melhor do que nós para dizer o que o mar precisa?”


O evento serviu como palco para o fortalecimento da declaração política da pesca artesanal de pequena escala, que reafirma os cinco pontos centrais da sua agenda internacional: (1) acesso preferencial e cogestão de 100% das áreas costeiras; (2) valorização das mulheres como agentes de inovação; (3) proteção dos pescadores contra a competição predatória da economia azul; (4) transparência e prestação de contas na gestão pesqueira; e (5) construção de comunidades costeiras resilientes, com oportunidades para jovens e fortalecimento da autonomia local.


Gaoussou Gueye, presidente da Confederação Africana de Organizações Profissionais da Pesca Artesanal, destacou: “A contribuição dos pescadores artesanais para a segurança alimentar é essencial. Por isso, pedimos que a pesca de pequenos pelágicos seja reservada aos nossos territórios.” Ele defendeu que o conhecimento tradicional precisa estar em pé de igualdade com a ciência institucional: “A sabedoria dos que vivem do mar deve orientar as decisões. A governança azul precisa ser de diálogo, não de imposição.”


A participação brasileira também teve destaque ao longo da conferência. Representantes de movimentos sociais, comunidades pesqueiras e instituições da sociedade civil estiveram em Nice defendendo a valorização dos saberes tradicionais, a luta por territórios pesqueiros e o combate à desigualdade no acesso aos recursos marinhos.


Durante o evento, a comitiva brasileira reforçou a importância de reconhecer juridicamente os territórios pesqueiros tradicionais, de garantir direitos à pesca artesanal e de fortalecer políticas públicas que protejam a autonomia das comunidades costeiras. A presença ativa do Brasil no painel e nos corredores da UNOC3 reafirmou o protagonismo das vozes do Sul Global na disputa por um oceano justo e acessível.


Governança regional é chave para proteger comunidades pesqueiras

"As comissões regionais de atum funcionam como recifes vivos de cooperação, onde membros diversos se unem para sustentar não apenas os estoques de atum, mas a integridade de toda a teia oceânica", afirmou Wesley Simina, Presidente dos Estados Federados da Micronésia, no Painel "Promoção e apoio a todas as formas de cooperação, especialmente em nível regional e sub-regional". Ele defendeu o fortalecimento da cooperação regional diante dos impactos climáticos que estão redesenhando os padrões migratórios de espécies marinhas, como o atum - essencial para a segurança alimentar de milhões, especialmente os pescadores artesanais.


Manguezais e corais são infraestrutura de sobrevivência

"Precisamos redefinir o que é infraestrutura: mangues e recifes são ativos vivos que não depreciam, mas aumentam de valor com o tempo", disse Ashleigh McGovern, Vice-presidente Sênior do Center for Oceans, da Conservação International, no Painel: "Aproveitamento das interligações entre oceano, clima e biodiversidade". Segundo ela, os mecanismos de conservação precisam ser planejados com a participação ativa das comunidades que vivem nos territórios. "Proteger sem envolver quem vive ali é injustiça, não conservação", declarou, destacando que marcos de proteção marinha, como o 30x30, só farão sentido se implementados com equidade.


Sistema global favorece pesca industrial e sufoca a artesanal

"Construímos sistemas que criam riqueza ao destruir a natureza, que promovem desigualdade ao minar a prosperidade", afirmou a representante da UNCTAD (Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento), durante “Sessão de Debate Geral - Declarações de alto nível e representantes da ONU”. Em 2023, o comércio oceânico chegou a US$ 2,2 trilhões, mas comunidades que dependem da pesca artesanal seguem à margem de investimentos, sem acesso justo aos recursos e espaços marinhos. A fala destaca o paradoxo de um sistema que alimenta a desigualdade enquanto proclama metas de sustentabilidade.


Oceano é herança comum: gestão além das fronteiras é urgente

"O oceano não é apenas um recurso, é nossa herança comum, nossa linha de vida e o legado que deixamos para as futuras gerações", declarou Filimon Manoni, Comissário do Oceano Pacífico, ao longo do Painel: "Promoção e apoio a todas as formas de cooperação, especialmente em nível regional e sub-regional". Ele reforçou que a gestão de áreas além da jurisdição nacional é essencial, pois o que ocorre em uma parte do oceano impacta diretamente outras. Para comunidades pesqueiras, essa interdependência significa que ações locais só terão efeito real se forem acompanhadas de governança multilateral eficaz.


Biodiversidade marinha e justiça para comunidades tradicionais

"Proteger a biodiversidade não é acessório da ação climática - é sua base", afirmou Chung Keeyong, Embaixador para Mudanças Climáticas da República da Coreia. O Painel "Aproveitamento das interligações entre oceano, clima e biodiversidade" discutiu os vínculos entre clima, biodiversidade e oceanos, e diversos especialistas defenderam que soluções baseadas na natureza devem integrar saberes tradicionais e garantir repartição de benefícios. "É preciso um olhar de justiça e equidade", reforçou Jean-Pierre Gattuso, Professor Sênior do Laboratoire d'Océanographie de Villefranche, ao apontar os riscos da mineração em águas profundas e da governança fragmentada que ignora as vozes locais.


Confira os destaques da imprensa sobre o 4º Dia da UNOC3




Confira resumos diários dos principais debates realizados na UNOC3: 1º Dia  | 2º Dia  | 3º Dia  | 4º Dia  | 5º Dia


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